Reportagem de Daniel Pereira, publicada em edição impressa de VEJA
A APOSTA DOS CRIMINOSOS
Condenados
a penas de prisão por corrupção e formação de quadrilha, os mensaleiros
do PT agora acreditam que a impunidade virá pela escolha de um novo
ministro do STF simpático à causa deles. Seria um tapa na cara da
opinião pública brasileira
O Supremo Tribunal Federal (STF) precisou de 53 sessões plenárias e
138 dias para condenar, no ano passado, 25 dos 38 réus do processo do
mensalão. No maior julgamento de sua história, aplicou penas que chegam a
quase 270 anos de prisão e multas de 22 milhões de reais.
Considerada um divisor de águas na luta contra a impunidade que
beneficia os criminosos de colarinho-branco, essa decisão ainda não foi
executada. Mas será? Nos bastidores da corte, um grupo de ministros
trabalha para que isso nunca ocorra.
A impunidade passa pela indicação de um novo integrante para o STF
simpático à tese da redução das penas impostas aos mensaleiros. Isso
livraria da prisão em regime fechado o ex-ministro José Dirceu. Como se
sabe, Dirceu foi condenado por ser o chefe da quadrilha que subornou
parlamentares, no primeiro mandato do ex-presidente Lula, usando
dinheiro desviado dos cofres públicos.
Do ponto de vista técnico, a esperança dos condenados se chama
“embargos infringentes”, recurso previsto no Código de Processo Penal
que permite aos réus reabrir os processos quando suas condenações em
tribunais não tiverem sido unânimes.
O uso desse recurso no STF em casos de réus com foro privilegiado,
sob a atual Constituição, seria algo inédito. Por essa razão, os
ministros precisarão decidir, antes de mais nada, se é cabível
extrapolar essa regra para a mais alta corte do país. Os ministros estão
divididos sobre essa questão.
Portanto, não é de todo impossível que o julgamento do mensalão seja
reaberto para reexame das condenações ou das partes em que houve
divergência. Os advogados dos mensaleiros estão prontos para pedir ao
Supremo que receba e discuta os “embargos infringentes”.
Uma decisão favorável à reabertura do processo, certamente,
repercutirá muito mal perante a opinião pública, que comemorou no ano
passado a inédita condenação à prisão de gente poderosa no Brasil. Perto
da reação dos brasileiros ao tomar conhecimento de que o processo será
reaberto, as questões de jurisprudência são a parte mais branda do caso.
Os defensores acreditam que conseguirão derrubar a condenação por
formação de quadrilha imposta a Dirceu, ao ex-tesoureiro do PT Delúbio
Soares e ao ex-presidente petista José Genoino, entre outros. Se isso
ocorrer mesmo, a pena de Dirceu cairá de dez anos e dez meses para sete
anos e onze meses.
Isso significa que ele se livrará da cadeia em tempo integral, sendo
recolhido ao cárcere apenas para passar a noite. No caso do deputado
José Genoino, a pena de prisão cairia de seis anos e onze meses para
quatro anos e oito meses, decisão que impactaria o número de dias que
ele dormirá na prisão.
O regimento interno do STF prevê a possibilidade de embargos
infringentes quando há quatro votos contrários à condenação – exatamente
a quantidade obtida pelos petistas no caso da formação de quadrilha.
Ocorre que o regimento interno é anterior à Constituição de 1988 e a uma
lei de 1990 que regulamentou o andamento das ações penais nos tribunais
superiores.
A Carta e a legislação ignoraram o tema, que, no entanto, permaneceu
no regimento interno do STF. Vale o regimento ou se considera que, ao
ignorar a existência dos embargos infringentes, a Constituição e a lei
estão dizendo que eles não são cabíveis? É essa a questão que divide o
STF agora. “Não faz sentido entender que a norma prevista no regimento
interno subsiste à lei”, pondera um ministro. Outro ministro lembra que o
acolhimento dos embargos infringentes resultaria em uma anomalia
gritante.
Ela pode ser resumida assim: com apenas seis votos, o STF pode
declarar a inconstitucionalidade de regras aprovadas no Congresso
Nacional, mas nem com sete votos pode condenar definitivamente um réu de
ação penal quando este obteve quatro votos a favor de sua absolvição.
Ou seja, nessa hipótese, um réu teria mais força jurídica do que um
Poder da República.
Esses argumentos não desanimam os advogados dos réus do mensalão.
Eles dizem que a questão ainda está aberta e espalham que quatro
ministros já concordam com a apresentação de embargos infringentes. Para
formarem a maioria no plenário, portanto, os advogados precisariam
conquistar o apoio de Teori Zavascki, ministro que tomou posse no fim do
ano passado e que não participou do julgamento do mensalão, e do futuro
ministro que ainda será indicado pela presidente Dilma Rousseff para a
vaga aberta pela aposentadoria de Carlos Ayres Britto.
Dilma deve anunciar sua escolha nos próximos dias. Há muita
especulação sobre quem será o 11° integrante do Supremo Tribunal
Federal. A claque dos mensaleiros anda a propagar que o STF precisa de
um tributarista ou de um processualista, quando no fundo quer mesmo um
petista. Joaquim Barbosa, presidente do STF, não esconde seu desagrado
com o lobby político disfarçado de preocupação técnica. Ele fez chegar à
presidente Dilma Rousseff o seguinte conselho: “O STF não precisa de
tributaristas ou criminalistas. Precisa de estadistas”.
fonte: http://veja.abril.com.br
Nenhum comentário:
Postar um comentário