A Segunda Turma do Supremo Tribunal Federal (STF) determinou o
trancamento, por unanimidade de votos, de ação penal instaurada na
Justiça Militar contra o primeiro-sargento do Exército A.R.S. para
apurar a suposta prática dos crimes de incitação à desobediência (artigo
155 do Código Penal Militar - CPM) e crítica indevida às Forças Armadas
(artigo 166 do mesmo Código). De acordo com a denúncia, declarações do
sargento, então dirigente da Associação de Praças do Exército (APEB),
divulgadas na página da APEB/RN na internet e a sua participação na
confecção do panfleto distribuído à população durante o desfile
cívico-militar de 7 de setembro de 2005, em Natal (RN), configurariam a
prática dos crimes.
No panfleto, o público que assistia ao desfile foi informado de que
os jovens atendidos pelo projeto “Soldado Cidadão”, do Governo Federal,
recebiam soldo inferior ao salário mínimo (R$ 168,00 contra os R$ 300,00
então vigentes), cumpriam jornada de trabalho superior à fixada pela
Constituição e que, “embora tenham ingressado nas Forças Armadas
motivados pela perspectiva de uma formação profissional, lhes eram
propiciados apenas faxinas e serviços de escala”. A publicação afirmava
que era necessário alertar a população em geral sobre a real situação
dos soldados que se apresentavam naquela solenidade, para que
refletissem sobre a questão.
Ao votar pelo trancamento da ação penal, o relator do Habeas Corpus
(HC) 106808, ministro Gilmar Mendes, afirmou que os fatos narrados na
denúncia e atribuídos ao primeiro-sargento não configuram os crimes de
incitamento à desobediência, muito menos o de crítica indevida às Forças
Armadas. “No que diz respeito ao delito de incitamento, as condutas
narradas na denúncia não se subsumem ao tipo penal do artigo 155 do CPM
porque em nenhum momento houve incitação ao descumprimento de ordem de
superior hierárquico”, destacou o relator. “Assim, não há de se falar em
incitação à desobediência, uma vez que o panfleto sequer se direcionava
aos soldados ou individualizava um ato específico de superior
hierárquico a ser desobedecido. As críticas feitas às condições dos
soldados do Exército Brasileiro propunham apenas uma reflexão sobre o
assunto por parte da população que assistia ao desfile”, afirmou.
O mesmo ocorreu quanto ao segundo delito, na avaliação do relator. “A
meu ver, não há, no caso concreto, uma crítica a um ato específico do
militar X ou Y, tampouco a uma penalidade aplicada ao soldado W ou Z.
Contudo, de tal publicação não se identifica afronta à disciplina
militar. Não se ignora que, nos termos do artigo 142 da Constituição, as
Forças Armadas são organizadas com base na hierarquia e na disciplina.
Entretanto, disciplina e desmandos não se confundem. Quem critica o
autoritarismo não está a criticar a disciplina. Frise-se ainda que a
liberdade de associação presta-se a satisfazer necessidades várias dos
indivíduos, aparecendo na Constituição atual como básica para o Estado
Democrático de Direito. Os indivíduos se associam para serem ouvidos,
concretizando o ideário da democracia participativa. Uma associação que
deva pedir licença para criticar situações de arbitrariedade terá sua
atuação completamente esvaziada”, concluiu.
Os ministros Ricardo Lewandowski (presidente da Segunda Turma) e
Celso de Mello acompanharam o voto do relator e determinaram o
trancamento da ação penal em curso na 7ª Circunscrição Judiciária da
Justiça Militar de Recife (PE).
fonte: www.stf.jus.b
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